Cartilha do Inventário Judicial e Extrajudicial no Brasil
Conceitos iniciais: O que é inventário e quando é necessário
O inventário é o procedimento legal destinado a apurar e transferir os bens, direitos e dívidas de uma pessoa falecida para seus herdeiros. Em outras palavras, é por meio do inventário que se faz o levantamento de todo o patrimônio deixado pelo falecido, permitindo a partilha legal entre os herdeiros conforme a lei. A realização do inventário é obrigatória sempre que alguém falece deixando bens a transmitir – trata-se de um passo essencial para regularizar esses bens em nome dos sucessores e viabilizar a distribuição da herança. Mesmo em um momento delicado de luto, é necessário iniciar o inventário para assegurar os direitos da família e formalizar a transferência da herança.
No Brasil, a legislação estabelece prazos para dar entrada no inventário. O Código de Processo Civil (CPC) determina que o processo de inventário deve ser instaurado em até 2 meses a contar do falecimento, e concluído, sempre que possível, em até 12 meses. Esses prazos podem ser prorrogados pelo juiz se necessário, mas muitas legislações estaduais preveem penalidades tributárias (multas) caso a abertura do inventário atrase além de 60 dias. Portanto, é importante não adiar: a falta de inventário impede os herdeiros de exercer plenamente seus direitos sobre os bens (por exemplo, vender um imóvel que ainda está em nome do falecido) e pode gerar complicações legais e financeiras no futuro. Em suma, sempre que ocorre um óbito com bens a transmitir, é necessário realizar o inventário, seja pela via judicial ou em cartório, conforme o caso.
Diferenças entre inventário judicial e inventário extrajudicial
O inventário pode ser feito de duas formas: pela via judicial, dentro de um processo no Poder Judiciário, ou pela via extrajudicial, diretamente em cartório de notas, sem processo judicial. A principal diferença está no procedimento e requisitos de cada modalidade:
- Inventário Judicial: É o meio tradicional, realizado perante um juiz. Envolve a abertura de um processo no Fórum (Vara de Sucessões) do último domicílio do falecido ou local dos bens. O juiz conduzirá todas as etapas, desde a nomeação de um inventariante até a homologação final da partilha. O inventário deverá ser judicial nos casos em que a lei não permite a via extrajudicial, por exemplo quando há herdeiros incapazes (menores de 18 anos ou interditados), quando existe um testamento válido deixado pelo falecido, ou se houver conflito ou divergências entre os herdeiros. Nesses cenários, é obrigatória a atuação do Judiciário para garantir os direitos envolvidos. Mesmo em situações elegíveis ao cartório, os interessados podem optar pelo judicial se assim preferirem (embora geralmente a opção extrajudicial seja mais vantajosa em termos de rapidez e custo, como veremos).
- Inventário Extrajudicial: É realizado em cartório de notas, por meio de escritura pública, sem a necessidade de tramitação em um processo judicial convencional. Foi introduzido pela Lei n.º 11.441/2007 e regulamentado pelo CNJ na Resolução 35/2007, representando um avanço na desburocratização dos procedimentos de sucessão. Para utilizar essa modalidade, todos os herdeiros devem estar de acordo quanto à partilha (consenso) e, pela regra geral, todos devem ser maiores e plenamente capazes. Além disso, se houver testamento deixado pelo falecido, a via extrajudicial só será possível se o testamento já tiver sido apresentado e confirmado judicialmente (ou se o testamento for considerado revogado ou inválido). A presença de um advogado é obrigatória na escritura – o tabelião somente lavrará o ato se os interessados estiverem assistidos por um advogado (que pode ser um só para todos ou um para cada, conforme o caso). Uma vantagem é que o inventário em cartório pode ser feito em qualquer Tabelionato de Notas de livre escolha das partes, independentemente do domicílio do falecido ou da localização dos bens.
⚖️ Mudança recente: Historicamente, a existência de herdeiros menores ou incapazes impossibilitava o inventário extrajudicial, exigindo obrigatoriamente o processo judicial. Entretanto, em agosto de 2024, o Conselho Nacional de Justiça atualizou as regras e passou a permitir inventários extrajudiciais mesmo havendo herdeiros menores/incapazes, desde que todos estejam em consenso e que a divisão assegure integralmente os direitos dos incapazes. Nesses casos, o Ministério Público deve revisar a escritura de partilha para confirmar se a partilha é justa; se o MP identificar qualquer irregularidade ou se surgir contestação de terceiros, a escritura precisará ser submetida a homologação judicial. Ou seja, a via extrajudicial com menores só é válida quando realmente não há conflito e todos os interesses estão protegidos. Essa mudança busca agilizar a transmissão patrimonial mesmo quando há incapazes, mas mantém salvaguardas: havendo discordância ou dúvida sobre os interesses do menor, o caso retorna ao Judiciário.
Em resumo, o inventário judicial é mais formal e demorado, porém é obrigatório nas situações em que a lei exige intervenção do juiz (conflitos, testamento não homologado, incapazes sem consenso). Já o inventário extrajudicial é geralmente mais rápido, simples e menos burocrático, indicado quando todos os herdeiros estão aptos e de acordo. Ambos os procedimentos têm a mesma validade jurídica – uma escritura pública de inventário, quando feita dentro dos requisitos legais, vale tanto quanto uma sentença judicial na transmissão dos bens aos herdeiros. A seguir, detalhamos o passo a passo de cada modalidade.
Passo a passo de cada procedimento
Inventário Judicial (via Judiciário)
- Contratação de advogado: O primeiro passo é escolher um advogado de confiança, preferencialmente especializado em direito de família/sucessões. A participação de um advogado é obrigatória em qualquer inventário – ele orientará a família e preparará a documentação necessária. Se os herdeiros tiverem interesses alinhados, podem até constituir um único advogado para todos; mas em caso de conflitos, cada um deverá ter sua representação legal.
- Abertura do processo no prazo legal: Deve-se protocolar uma petição de abertura de inventário no fórum competente, de preferência dentro de 60 dias após o óbito para evitar multas fiscais. A petição inicial normalmente indica os dados do falecido (nome, data do óbito, último domicílio), lista prévia de herdeiros conhecidos, descrição provisória dos bens e dívidas, e pede a nomeação de um inventariante. Um dos documentos fundamentais nessa etapa é a certidão de óbito, juntada já na abertura do processo.
- Nomeação do inventariante: O juiz analisará a petição inicial e nomeará um inventariante, que é o responsável legal pelo espólio durante o inventário. Geralmente é escolhido o cônjuge sobrevivente ou outro herdeiro indicado (pode haver acordo entre os herdeiros sobre quem assumirá essa função). O inventariante assume o compromisso de bem administrar os bens do falecido e de prestar contas.
- Levantamento dos bens, dívidas e herdeiros: Com o inventário em andamento, inicia-se a fase de declarações. O inventariante, assistido pelo advogado, apresenta ao processo as chamadas primeiras declarações, listando detalhadamente todos os bens, direitos e dívidas deixados pelo falecido, bem como quem são os herdeiros e seus vínculos (filhos, cônjuge, etc.). Nessa etapa, reúne-se a documentação de cada bem (matrículas de imóveis, documentos de veículos, extratos bancários, etc.) e eventuais certidões negativas de débitos. Se necessário, o juiz pode determinar avaliações de bens para apurar valores justos (por exemplo, avaliação judicial de um imóvel, caso haja dúvida sobre o valor).
- Pagamentos de dívidas e do imposto (ITCMD): Identificadas eventuais dívidas do falecido, os herdeiros podem providenciar seu pagamento ou negociar com credores, já que as dívidas até onde os bens da herança alcançam devem ser quitadas antes da partilha. Também é necessário calcular e recolher o ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis), que é o tributo estadual sobre heranças. O pagamento do ITCMD é obrigatório em qualquer inventário e geralmente deve ser efetuado dentro do processo (em alguns Estados, é exigido antes da conclusão da partilha). O não pagamento no prazo pode acarretar multas e juros. Em muitos casos, o juiz somente homologará a partilha após comprovação de que o imposto foi pago.
- Decisão sobre a partilha dos bens: Com todos os bens relacionados e tributos pagos, define-se como os bens serão divididos entre os herdeiros. Se houver acordo entre todos (partilha amigável), os herdeiros apresentam um plano de partilha consensual ao juiz, discriminando quais bens caberão a cada um ou se serão vendidos para repartir o valor, etc. Caso não haja consenso – por exemplo, se um herdeiro não concorda com a divisão proposta – o inventário se torna litigioso: abre-se espaço para contestações e eventuais incidentes (discussões judiciais sobre inclusão/exclusão de bens ou herdeiros, por exemplo). O processo então segue um rito contencioso, com fases típicas (alegações, produção de provas, decisões intermediárias). Em última instância, caberá ao juiz decidir a partilha de forma equitativa conforme a lei, se os envolvidos não chegarem a um acordo.
- Homologação e expedição do formal de partilha: Estando definida a divisão (seja por acordo entre as partes ou por decisão judicial), o juiz profere uma sentença de homologação da partilha. Essa sentença final confirma como o patrimônio do falecido será distribuído e encerra o inventário. Em seguida, o cartório judicial emite os documentos necessários para os herdeiros tomarem posse efetiva dos bens: o principal é o Formal de Partilha (quando há mais de um herdeiro partilhando os bens) ou a Carta de Adjudicação (quando apenas um herdeiro fica com todo o acervo, ou no caso de um único herdeiro receber um bem específico). Esses documentos são títulos hábeis para transferir a propriedade dos bens aos herdeiros.
- Registro e transferência dos bens aos herdeiros: De posse do formal de partilha ou carta adjudicatória, cada herdeiro deve providenciar a transferência registral dos bens para seu nome. Por exemplo: imóveis são transferidos levando-se o formal de partilha ao Cartório de Registro de Imóveis competente, onde será feita a averbação na matrícula do imóvel; veículos são transferidos junto ao órgão de trânsito (DETRAN) mediante apresentação do formal; saldos em contas bancárias ou investimentos geralmente requerem apresentação do formal ao banco para liberação; participações societárias são averbadas na Junta Comercial ou Cartório de Pessoa Jurídica, e assim por diante. Somente após esses registros é que, do ponto de vista prático, os bens estarão regularizados em nome dos herdeiros. Com isso, o processo de inventário judicial se encerra completamente.
Tempo de duração: O inventário judicial envolve diversas etapas formais (petição inicial, citações/intimações, eventuais contestações, despacho judiciais, etc.). Se todos os herdeiros estiverem de acordo e a documentação estiver em ordem (inventário amigável), é possível concluir em torno de 6 a 12 meses um inventário judicial simples. No entanto, atrasos são comuns – seja por sobrecarga do judiciário, seja por necessidade de avaliações ou disputas – e não é raro um inventário demorar vários anos quando há litígio ou maior complexidade. Existem casos extremos em que inventários judiciais se arrastam por uma década ou mais devido a brigas familiares ou muitos bens espalhados. Em contrapartida, a lei permite a modalidade de arrolamento (um tipo simplificado de inventário judicial) quando todos estão de acordo ou quando o valor do espólio é baixo, o que pode reduzir prazos. Ainda assim, de modo geral, o caminho judicial tende a ser bem mais lento e burocrático que a via extrajudicial.
Inventário Extrajudicial (via Cartório)
- Contratação de advogado: Assim como no judicial, a presença de um advogado é obrigatória no inventário em cartório. Os herdeiros podem contratar um único advogado de comum acordo (o que é usual na via extrajudicial, já que pressupõe consenso entre eles). O advogado orientará na reunião dos documentos, na definição da partilha e fará a interface com o cartório, redigindo o requerimento e a minuta da escritura.
- Reunir documentos necessários: Com auxílio do advogado, os herdeiros devem providenciar todos os documentos exigidos para lavrar a escritura pública de inventário. Isso inclui documentos pessoais (identidade, CPF) do falecido e dos herdeiros, certidão de óbito, certidões de estado civil (casamento/nascimento) dos envolvidos, documentos comprobatórios de cada bem (matrículas de imóveis atualizadas, documento de propriedade de veículos, extratos bancários, etc.), certidão negativa de testamento ou o testamento em si (se houver), além de certidões negativas de débitos e outros documentos detalhados na seção de documentos mais adiante. Ter essa documentação completa antecipadamente agiliza muito o processo.
- Escolha do cartório e início do procedimento: Diferentemente do processo judicial, no qual existe um foro determinado, no inventário extrajudicial os interessados têm liberdade para escolher qualquer Cartório de Notas de sua confiança, em qualquer localidade do país. Os herdeiros devem comparecer (ou contatar) o tabelionato escolhido e informar a intenção de realizar ali o inventário. É necessário informar os dados básicos do falecido, apresentar a documentação reunida e formalizar a manifestação de vontade de todos os herdeiros em proceder extrajudicialmente. O cartório abrirá um expediente interno para o caso e poderá orientar quanto a eventuais documentos faltantes.
- Declarações e minuta da partilha: Com base nas informações e documentos fornecidos, o advogado prepara um requerimento ou minuta de inventário extrajudicial, indicando os herdeiros, a relação de todos os bens, dívidas e direitos do falecido, e propondo a forma de partilha (quem ficará com qual bem ou percentual). Essa minuta é enviada ao tabelião, que a revisará e elaborará a minuta da escritura de inventário e partilha. Os herdeiros e o advogado devem conferir atentamente essa minuta para assegurar que tudo está correto e de acordo com o que foi combinado.
- Pagamento do ITCMD (imposto causa mortis): Assim como no inventário judicial, também no cartório os herdeiros precisam recolher o ITCMD devido sobre a herança antes de concluir a escritura. O imposto é calculado conforme o valor dos bens e as alíquotas do Estado competente (variam geralmente de 4% a 8%). O advogado ou o próprio cartório preenche a declaração do ITCMD e gera a guia de pagamento para quitação. É fundamental pagar esse tributo, pois a escritura só será assinada após a comprovação do recolhimento (a escritura pública normalmente menciona os dados da guia paga). Se o inventário extrajudicial não for aberto dentro de 60 dias do óbito, pode incidir multa sobre o ITCMD, que em alguns estados inicia em 10% e chega a 20% após 180 dias de atraso – mais um motivo para não demorar.
- Assinatura da escritura pública: Estando tudo em ordem – documentos, minuta conferida e imposto pago – agenda-se um momento para os interessados assinarem a escritura de inventário e partilha no cartório. Todos os herdeiros (ou seus procuradores, se alguém não puder comparecer pessoalmente) e o advogado devem assinar. O tabelião faz a leitura formal da escritura, que descreverá toda a situação (qualificação do falecido, dos herdeiros, relação de bens, partilha acordada, quitação de imposto, etc.) e declarará transferidos os bens aos herdeiros conforme a divisão acordada. Caso algum herdeiro não possa estar presente, ele pode constituir uma procuração pública autorizando outra pessoa a assinar em seu nome.
- Pagamento das custas cartorárias: No ato de assinatura ou antes de retirar a escritura, é necessário pagar as taxas do cartório (emolumentos notariais). Os valores variam conforme cada Estado e em função do valor dos bens inventariados, seguindo tabelas oficiais de emolumentos. Em geral, porém, as custas de cartório no inventário extrajudicial tendem a ser bem menores que as custas judiciais correspondentes. Os herdeiros também arcam com os honorários do advogado, conforme acordado previamente – vale lembrar que, apesar de o procedimento ser em cartório, há trabalho jurídico envolvido e o advogado fará jus aos honorários combinados.
- Registro e transferência dos bens: Após assinada e paga, a escritura pública de inventário é expedida pelo tabelião. Diferentemente do processo judicial, não é preciso homologação de um juiz – a escritura pública, por si só, já é o documento que formaliza a partilha com plena validade legal. De posse da escritura, os herdeiros devem realizar a transferência de cada bem para seu nome, tal como no passo 8 do inventário judicial: imóveis no Cartório de Registro de Imóveis, veículos no DETRAN, contas bancárias nos bancos, etc.. A escritura contém todos os dados necessários para esses registros (ela mesma substitui o “formal de partilha” do processo judicial). Após a efetivação dos registros, o inventário extrajudicial estará totalmente concluído e os bens, regularizados.
Tempo de duração: O inventário em cartório costuma ser muito mais rápido que o judicial. Em casos simples e com documentos em ordem, é possível concluí-lo em poucos dias ou semanas – há situações em que, após pagar o imposto, os herdeiros marcaram a assinatura e resolveram tudo em 1 dia no cartório. Estudos apontam que, em média, um inventário extrajudicial leva cerca de 45 dias para ser finalizado, considerando o tempo de reunir documentos, calcular e pagar o imposto e agendar no tabelionato. Essa rapidez contrasta com o processo judicial, que muitas vezes leva meses ou anos. A agilidade do cartório se deve ao trâmite administrativo simplificado, sem necessidade de seguir tantas etapas formais ou esperar despachos de juiz. Assim, quando viável, a via extrajudicial poupa tempo precioso, permitindo que os herdeiros tenham acesso aos bens de forma muito mais célere.
Documentos exigidos no inventário (judicial e extrajudicial)
A documentação é fundamental em qualquer inventário. Muitos documentos são comuns a ambos os tipos de procedimento, enquanto alguns podem ser específicos para o judicial ou extrajudicial. Abaixo, listamos os principais documentos geralmente exigidos:
- Certidão de Óbito do falecido – documento básico que comprova o falecimento e dá início à sucessão.
- Documentos de identidade e CPF do falecido e de todos os herdeiros. (No caso de herdeiro casado, geralmente inclui-se também documento do cônjuge devido ao regime de bens; e se algum herdeiro for falecido, inclui-se documentação dos seus sucessores.)
- Certidão de casamento do falecido (se era casado ou viúvo, para comprovar o estado civil e o regime de bens) e certidões de casamento/nascimento dos herdeiros. Herdeiros casados devem apresentar certidão de casamento; os solteiros, certidão de nascimento atualizada.
- Pacto antenupcial, se o falecido era casado sob regime de bens que o exija (por exemplo, separação de bens por pacto).
- Testamento deixado pelo falecido, se houver, ou certidão negativa de testamento. Esta certidão é obtida em registro público (Registro Central de Testamentos) para confirmar se existe testamento registrado. Se houver testamento, no judicial será necessário apresentá-lo para ser judicialmente analisado; no extrajudicial, só prosseguirá se o testamento já tiver sido confirmado pelo juiz (ou se for considerado revogado/caduco).
- Relação de bens com documentação comprobatória: inclui certidões de matrícula atualizadas de imóveis (documento do cartório de imóveis mostrando a propriedade e ônus do bem), documentos de veículos (CRV/CRLV), extratos bancários ou de investimentos em nome do falecido, documentos de participação societária (contrato social ou ficha cadastral se tinha empresa), certificados de propriedade de bens móveis valiosos, CCIR e ITR se houver imóvel rural, etc.. Em suma, todos os documentos que comprovem e detalhem os bens a serem partilhados.
- Certidões negativas fiscais e de ações judiciais: é comum exigir certidões que comprovem a ausência de débitos tributários em nome do falecido (certidão negativa da Receita Federal/PGFN, certidão de débitos estaduais/municipais, etc.) e certidões forenses indicando se há processos contra o espólio. No extrajudicial, os tabeliães geralmente solicitam essas certidões para prevenir transferências de bens com pendências. No judicial, algumas dessas certidões também podem ser apresentadas ou consultadas, mas eventuais dívidas serão resolvidas no próprio processo.
- Documento de identidade e OAB do advogado e eventualmente uma procuração por instrumento público, se um ou mais herdeiros forem representados por procuração na escritura em cartório. (No judicial, se o advogado assinar a petição inicial em nome dos herdeiros, precisa de procuração assinada pelos clientes, mas não necessariamente pública.)
- GUIA do ITCMD e comprovante de pagamento do imposto: no final do processo judicial, ou antes da escritura extrajudicial, deve-se apresentar a guia recolhida do imposto de transmissão causa mortis, com a devida declaração do valor dos bens. Esse documento comprova que os impostos foram pagos, condição indispensável para concluir a partilha.
Essa lista cobre os documentos mais usuais. Atenção: casos específicos podem exigir documentos adicionais – por exemplo, se algum herdeiro for representado por tutor/curador (no caso de incapaz), serão necessários os termos de tutela/curatela; se houver bem de menor valor a ser adjudicado via alvará, pode precisar de documentação extra; se o falecido era servidor público, pode ser preciso demonstrar a situação de pensão etc. De modo geral, reunir todos os documentos pessoais e dos bens o quanto antes agiliza muito o inventário. Muitos cartórios e tribunais disponibilizam checklists de documentos para orientar as famílias (ver seção de checklist adiante).
Vantagens e desvantagens de cada tipo de inventário
Tanto o inventário judicial quanto o extrajudicial apresentam pontos positivos e negativos. A seguir, trazemos uma visão geral das vantagens e desvantagens de cada modalidade para ajudar a entender qual pode ser mais adequada em cada situação.
✅ Vantagens do Inventário Extrajudicial
- Rapidez: A tramitação em cartório é significativamente mais célere. Inventários extrajudiciais costumam se resolver em semanas – às vezes até em dias – enquanto no Judiciário podem levar muitos meses ou anos. Essa rapidez permite aos herdeiros usufruir dos bens mais prontamente, evitando a longa espera da via judicial. Há relatos de inventários em cartório concluídos no mesmo dia em que foram assinados, após toda documentação e impostos estarem prontos.
- Menor burocracia: No cartório, o procedimento é mais simples e informal. Não há audiências, prazos judiciais ou atos processuais complexos. Com consenso, basta reunir os documentos, pagar o imposto e assinar a escritura. Isso reduz o estresse e a “via crucis” burocrática que muitos associam aos processos judiciais. O ambiente extrajudicial tende a ser menos conflituoso e mais adequado a soluções amigáveis.
- Custos potencialmente menores: Embora tanto no judicial quanto no extrajudicial haja custos (imposto, advogado etc.), a via extrajudicial economiza nas custas processuais. Não há custas judiciais nem despesas com peritos judiciais, por exemplo. Segundo dados da Anoreg/BR, o custo médio de um inventário no Judiciário gira em torno de R$ 2.370,00, enquanto no cartório a média fica em R$ 324,00 (sem contar impostos e honorários). Ou seja, os emolumentos notariais são, em geral, menores que as custas forenses, tornando o inventário em cartório financeiramente mais vantajoso em muitos casos. Estudo de Venosa aponta que os custos com taxas de cartório e honorários advocatícios na via extrajudicial podem ser até 40% menores em comparação ao inventário judicial.
- Liberdade de escolha e flexibilidade: Na esfera extrajudicial, os herdeiros têm mais liberdade para decidir qual cartório utilizar e podem agendar a assinatura conforme a conveniência de todos. Também podem dividir os bens de comum acordo da forma que acharem melhor (respeitados os direitos de cada um), sem ficarem estritamente adstritos a fórmulas judiciais – desde que haja consenso, a partilha pode ser moldada às necessidades da família.
- Desjudicialização e descongestionamento da Justiça: Ao optar pelo inventário em cartório, além de se beneficiarem, as partes contribuem para reduzir a sobrecarga do Poder Judiciário. A expansão dos inventários extrajudiciais vem desafogando os tribunais, que podem focar em casos mais complexos ou litigiosos. Trata-se de uma vantagem coletiva: procedimentos que podem ser resolvidos administrativamente são tirados da fila do Judiciário, aumentando a eficiência geral.
⚠️ Desvantagens do Inventário Extrajudicial
- Requisitos limitadores: A maior desvantagem é que nem todos os casos podem usar a via extrajudicial. Se houver qualquer impedimento legal – por exemplo, um herdeiro incapaz (sem consenso validado pelo MP), um testamento ainda não confirmado judicialmente, ou litígio entre os sucessores – o inventário terá que ser judicial (ver seção de impedimentos). Assim, famílias com menores de idade (antes de 2024) ou com desavenças estão excluídas dessa opção. O extrajudicial fica restrito aos casos mais simples e de acordo mútuo.
- Consenso obrigatório: A necessidade de 100% de acordo entre os herdeiros, embora seja uma vantagem quando existe, pode ser um entrave. Basta um herdeiro discordar da partilha proposta para inviabilizar o processo em cartório. Nesses casos, a família acaba tendo que recorrer ao Judiciário para resolver o conflito, perdendo a alternativa rápida. Portanto, o extrajudicial não oferece uma saída quando há disputas – sua premissa é justamente a inexistência delas.
- Pagamentos à vista: No inventário extrajudicial, normalmente é preciso quitar todas as despesas antes ou no momento da assinatura da escritura – especialmente o ITCMD e as taxas do cartório. Isso pode pesar no bolso de famílias que não dispõem de liquidez imediata. No inventário judicial, por sua vez, há a possibilidade de se pedir alvarás ou autorizações do juiz para, por exemplo, vender um bem da herança a fim de pagar impostos e despesas. Ou pode-se parcelar custas judiciais em alguns casos. Já no cartório, a lógica é diferente: sem pagar o imposto e emolumentos, a escritura não é finalizada. Essa exigência de desembolso imediato pode levar algumas famílias, que não tenham reserva financeira, a preferir o inventário judicial para ganhar tempo ou obter autorização para usar o próprio patrimônio herdado no custeio do processo.
- Menos intervenção em casos complexos: Embora a simplicidade seja uma vantagem, em situações mais complicadas ela pode virar desvantagem. Por exemplo, se existe uma dúvida jurídica sobre a validade de um documento ou se aparece um potencial herdeiro desconhecido, o tabelião de notas pode se recusar a lavrar a escritura sem uma definição judicial (ele não tem poder decisório como um juiz). Assim, casos complexos podem acabar redirecionados ao Judiciário de qualquer forma. Ou seja, o cartório não resolve mérito de conflitos – ele só formaliza acordos e situações claras. Se houver qualquer problema fora do escopo administrativo, a escritura extrajudicial fica inviável.
- Resistência ou desconhecimento: Apesar de não ser uma falha intrínseca do procedimento, ainda há desconhecimento por parte de muitos cidadãos (e até profissionais) sobre a possibilidade do inventário extrajudicial. Isso faz com que algumas famílias nem considerem essa opção e ingressem diretamente na via judicial, possivelmente arcando com processos longos desnecessariamente. Gradativamente essa situação vem melhorando, mas a cultura jurídica por vezes ainda privilegia “ir ao juiz” mesmo quando não seria obrigatório, o que pode ser visto como uma desvantagem prática da extrajudicialidade (falta de informação pode impedir seu uso).
✅ Vantagens do Inventário Judicial
- Indispensável para resolver disputas: A principal vantagem (e necessidade) do inventário judicial é que ele é o caminho disponível para casos em que não há acordo. Se os herdeiros brigam pela herança, ou se há dúvida sobre quem são os legítimos herdeiros, só o procedimento judicial pode solucionar – permitindo que cada parte exponha seus argumentos e provas e, ao final, o juiz imponha uma decisão. Portanto, o inventário judicial é indispensável em situações de conflito, garantindo um desfecho mesmo diante de divergências irreconciliáveis. O mesmo vale para casos de herdeiros incapazes ou testamento: o Judiciário assegura que haverá análise cuidadosa dos interesses dos menores ou da validade das disposições testamentárias.
- Supervisão e segurança jurídica: No processo judicial há a supervisão direta de um juiz, com participação do Ministério Público quando houver incapazes. Isso confere uma camada extra de garantia de que a lei será cumprida estritamente e que nenhum herdeiro terá seus direitos violados. Em casos complexos ou delicados, algumas famílias se sentem mais seguras tendo a “chancela” de um juiz. Por exemplo, se há muitos credores do falecido, o inventário judicial permite que todos sejam chamados e o juiz decida a ordem de pagamento conforme a lei, dando segurança aos herdeiros de que não herdarão pendências inesperadas. Assim, o ambiente judicial pode trazer maior rigor na solução de questões controvertidas.
- Possibilidade de medidas judiciais auxiliares: No âmbito do processo judicial, as partes podem solicitar diversas medidas que não existiriam no cartório. Por exemplo: uma liminar para bloquear a conta bancária do falecido e evitar desvio de dinheiro por alguém, ou para imitir um herdeiro na posse de um bem antes da partilha se houver abuso de outro. Também é possível requerer alvarás judiciais para atos urgentes (como vender um veículo que está deteriorando, com autorização do juiz, antes de terminar o inventário). Essas ferramentas oferecem flexibilidade para proteger o patrimônio durante a tramitação. Na via extrajudicial, não há como obter esse tipo de ordem – qualquer problema deve ser levado a um juiz de qualquer forma.
- Abrangência universal: Qualquer situação de sucessão pode ser resolvida pela via judicial. Não importa quão complicada: seja um herdeiro incapaz sem consenso, seja um testamento contestado, seja falta de contato com algum herdeiro (herdeiro em lugar incerto), dívidas superiores aos bens, etc. – o Judiciário tem procedimentos para todos os cenários (curadoria de ausentes, arrecadação de bens, declaratória de vacância, insolvência do espólio, etc.). Portanto, o inventário judicial é universalmente aplicável, ao passo que o extrajudicial é restrito. Essa abrangência é uma vantagem no sentido de que ninguém fica sem solução: sempre haverá o recurso do processo judicial para efetivar a transferência patrimonial, mesmo nas heranças mais problemáticas.
⚠️ Desvantagens do Inventário Judicial
- Lentidão e burocracia: A via judicial é reconhecidamente mais demorada e complexa. Envolve inúmeros atos formais (petições, despachos, publicações no Diário Oficial, etc.) e está sujeita à fila do Judiciário. Dados estatísticos mostram que um inventário na Justiça leva em média 1 a 2 anos para ser concluído mesmo quando não há litígio, e pode se estender muito mais se houver brigas – há processos inventários que duram 5, 10 ou até 20 anos em casos extremos. Além disso, a burocracia é maior: exige-se mais documentação formalizada, tudo precisa de autorização judicial, e os prazos processuais (que muitas vezes se alongam) são inevitáveis. Em suma, o processo judicial tende a ser moroso, o que pode retardar por muito tempo a entrega efetiva da herança aos herdeiros.
- Custos judiciais elevados: Tramitar um inventário nos tribunais implica pagamento de custas judiciais e despesas processuais que não existem na via cartorária. As custas variam por Estado e de acordo com o valor do espólio, mas costumam ser bem mais altas que as taxas de cartório. Por exemplo, além do ITCMD (que é comum aos dois), no processo judicial paga-se custas iniciais, taxas de impulso processual, eventualmente honorários de peritos (se houver avaliações ou partilha por perícia), etc. Conforme levantamento da Anoreg, enquanto um inventário em cartório teve custo médio de R$ 324, no Judiciário a média ficou em R$ 2.370 por processo. Ademais, a demora processual pode acarretar honorários advocatícios maiores – muitos advogados cobram honorários proporcionais ao trabalho e tempo investido, de modo que um caso que se arrasta anos tende a custar mais. Estimativas indicam que o custo total de um inventário judicial pode consumir até 20% do valor do patrimônio em casos complexos, enquanto o extrajudicial sairia 10% a 15% mais barato. Ou seja, no saldo final, o judicial geralmente é financeiramente mais oneroso para a família.
- Conflitualidade e desgaste emocional: Quando há disputas entre herdeiros, o processo judicial pode se tornar um conflito prolongado, com audiência, provas e uma atmosfera adversarial que pode desgastar as relações familiares. Mesmo quando não há briga, o simples fato de prolongar a resolução pode gerar ansiedade e tensão nos familiares, impedidos de dispor dos bens enquanto o processo não termina. O inventário judicial, por sua natureza formal, pode agravar conflitos latentes (por exemplo, abrindo espaço para um herdeiro implicar formalmente contra outro). Já no cartório, se chegou a assinar a escritura, é porque todos já acomodaram suas diferenças previamente. Então, ainda que em alguns casos o judicial seja inevitável, ele vem acompanhado de stress e carga emocional maiores para os envolvidos.
- Menor privacidade: O processo judicial é público (salvo raras exceções), e todos os atos e documentos acabam registrados nos autos que podem ser consultados (pelo menos por advogados de outras partes ou pessoas com interesse). Questões familiares e financeiras dos herdeiros e do falecido tornam-se parte de um registro público. No inventário extrajudicial, a escritura é um documento público também, mas não envolve tantos detalhes de tramitação, nem exposição em audiência. Assim, do ponto de vista de privacidade, algumas pessoas preferem tratar tudo de forma mais reservada no cartório, enquanto no Judiciário inevitavelmente há uma publicização maior dos dados do espólio.
Custos e prazos médios (atualizados 2023/2024)
Custos do inventário: Os custos de um inventário podem ser divididos em três grandes grupos: impostos, custas (judiciais ou cartorárias) e honorários advocatícios. O principal imposto é o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação), cobrado pelos Estados sobre o valor total da herança a ser transferida. A alíquota do ITCMD varia conforme cada Estado, geralmente entre 4% e 8% do valor dos bens transmitidos. Por exemplo, atualmente São Paulo adota até 4%, enquanto Estados como Rio de Janeiro e Santa Catarina podem chegar a 8%. Esse imposto incide igualmente tanto em inventários judiciais quanto extrajudiciais – não há diferença, pois é uma obrigação fiscal decorrente da sucessão, independentemente da via escolhida.
Além do imposto, há as custas do procedimento. No inventário judicial, as custas judiciais podem incluir taxa de distribuição do processo, custas intermediárias e finais, calculadas sobre o valor do espólio, conforme tabela do tribunal estadual. Em vários Estados, as custas judiciais somadas podem ficar na faixa de 1% a 4% do valor da herança, variando pelo tipo de procedimento (às vezes arrolamentos têm custas menores). Já no inventário extrajudicial, em vez de custas judiciais há os emolumentos do cartório de notas pela lavratura da escritura. Esses emolumentos também são tabelados por lei estadual e costumam ser proporcionais ao valor dos bens. Em muitos casos, as taxas de cartório são mais baratas que as judiciais equivalentes, o que ajuda a reduzir o custo total. Um relatório da Anoreg/BR indicou que, em média, o custo de um inventário no cartório foi de apenas R$ 324, contra cerca de R$ 2.370 no Judiciário – claro que números médios podem não refletir valores de heranças maiores, mas dão uma ideia da diferença de magnitude. Vale lembrar que em ambos os casos é obrigatório ter advogado, e os honorários advocatícios serão acordados com a família. Advogados costumam cobrar uma porcentagem do valor do espólio (percentuais de 2% a 6% são comuns, a depender da complexidade e do tamanho da herança) ou um valor fixo. No extrajudicial, o trabalho do advogado pode ser menor em duração, o que frequentemente se traduz em honorários mais acessíveis. De qualquer forma, a contratação do profissional deve ser discutida desde o início, e a família pode comparar propostas. Dica: famílias de baixa renda podem buscar a defensoria pública para inventários judiciais gratuitos, e alguns cartórios, nos casos extrajudiciais, também asseguram gratuidade de emolumentos para quem comprovar hipossuficiência (pobreza nos termos da lei).
Prazos médios: Em relação ao tempo, as estatísticas mais recentes confirmam a percepção geral: o inventário extrajudicial é muito mais rápido em média. Dados do CNJ de 2023 revelam que um inventário extrajudicial costuma levar em torno de 45 dias para ser concluído. Já o inventário judicial apresenta tempos muito variáveis – podendo ocorrer em 6 meses nos casos mais simples e rápidos, mas com média em torno de 12 a 24 meses mesmo sem litígio, e estendendo-se por vários anos se houver disputas ou burocracia extra. Um levantamento da Anoreg indicou que, frequentemente, um processo de inventário no Judiciário demora pelo menos 2 anos, enquanto no cartório, havendo consenso e documentação pronta, poderia ser resolvido até em 1 único dia (essa referência a “um dia” considera casos excepcionais em que todas as etapas já foram cumpridas antecipadamente e a escritura foi assinada prontamente). Em termos práticos, espera-se que um inventário amigável pelo rito judicial leve perto de um ano, enquanto no cartório a mesma situação poderia se resolver em um ou dois meses.
Fatores que influenciam o prazo: a organização dos herdeiros é fundamental – quanto mais rápido fornecerem documentos e pagarem o imposto, mais rápido tanto o juiz quanto o tabelião poderão finalizar. No Judiciário, a agenda do fórum e a carga de trabalho do cartório judicial também impactam; no extrajudicial, depende da disponibilidade do tabelionato e do cumprimento dos requisitos (ex.: se faltar um documento ou imposto, a escritura atrasa). Conflitos ou erros em documentos (como nome grafado errado que precisa correção) podem atrasar qualquer inventário, portanto a dica é prevenir problemas revisando toda documentação e ajustando divergências antes de iniciar formalmente.
Multas por atraso: Como mencionado, há também o aspecto do prazo legal para dar entrada. Muitos Estados estabelecem uma multa pelo atraso na abertura do inventário além de 60 dias do óbito. Geralmente, essa multa é um percentual sobre o ITCMD devido – por exemplo, 10% se perder o prazo inicial, podendo dobrar para 20% após um determinado tempo (180 dias, conforme a legislação de alguns Estados). Isso significa que demorar para iniciar o inventário pode tornar o custo ainda maior. Contudo, a lei federal não impõe sanção processual pelo descumprimento do prazo, sendo a multa um item tributário. De toda forma, para evitar esse custo extra e agilizar o acesso aos bens, o ideal é dar entrada no inventário o quanto antes, preferencialmente dentro do prazo de 2 meses pós-falecimento.
Variações regionais: Tanto os custos quanto os prazos podem variar conforme o Estado. Cada unidade da federação tem sua alíquota de ITCMD (por exemplo, 4% no Paraná, 8% em Goiás, etc.), assim como suas tabelas de custas judiciais e emolumentos de cartório. O tempo médio de tramitação judicial também difere: há estados cuja Justiça é mais célere, concluindo inventários simples em poucos meses, enquanto outros enfrentam maiores atrasos médios. Já no âmbito extrajudicial, pode haver diferenças na eficiência de cartório para cartório, mas de modo geral todos seguem a mesma normativa nacional (as recentes alterações do CNJ valem para todos os tabelionatos do país). Importante destacar que qualquer inventário extrajudicial poderá ser feito por escritura pública digitalmente via plataforma e-Notariado, se o cartório escolhido oferecer esse serviço, o que facilita para herdeiros que estão em cidades/países diferentes.
Resumo numérico (médias): Para facilitar, podemos resumir alguns números divulgados por entidades oficiais sobre inventários: tempo médio judicial ~ 12-24 meses; tempo médio extrajudicial ~ 1-2 meses (45 dias). Custo médio judicial ~ R$ 2.300 em custas (além de imposto e advogado); custo médio extrajudicial ~ R$ 300 em emolumentos. ITCMD entre 4% e 8% (igual nos dois). Multa por atraso: 10% a 20% do imposto em muitos estados após 60 dias de atraso. Honorários advocatícios: variáveis, possivelmente menores no extrajudicial devido à menor duração, mas em ambos podem girar em torno de 2-6% do valor dos bens (negociável caso a caso).
Importância da regularização patrimonial após o óbito
Realizar o inventário e regularizar o patrimônio do falecido é de suma importância por diversos motivos práticos e legais. Primeiramente, é uma exigência legal – como vimos, a lei obriga a instauração do inventário e o pagamento do imposto correspondente. Deixar de fazer o inventário não impede que a herança exista, mas faz com que os bens permaneçam irregularmente em nome do falecido, o que traz uma série of problemas: os herdeiros não conseguem vender ou transferir esses bens livremente, podem ocorrer disputas informais entre familiares, além de possíveis sanções fiscais (multas por atraso no imposto) e outras complicações.
A regularização patrimonial após o óbito garante segurança jurídica para os herdeiros. Assim que o inventário é concluído (seja via sentença judicial ou escritura pública), cada bem passa legalmente ao nome de quem tem direito. Isso evita, por exemplo, que imóveis fiquem “bloqueados” – sem inventário, um imóvel não pode ser vendido ou mesmo regularizado em cartório; um veículo não pode ser licenciado no nome do novo dono; valores bancários podem ficar inacessíveis. Com a partilha formalizada, os herdeiros passam a ter titularidade plena e podem exercer seus direitos de propriedade (usar, vender, hipotecar, etc.). Além disso, o inventário permite quitar dívidas do falecido de forma adequada, evitando que credores vão atrás dos herdeiros individualmente. Pelo inventário, paga-se o que o falecido devia dentro do limite do espólio, e os herdeiros recebem o líquido, sem confusões futuras.
Outro ponto importante é que o inventário evita futuros litígios familiares. Enquanto a situação patrimonial estiver indefinida, aumentam as chances de desentendimentos entre familiares acerca do uso e divisão dos bens. Regularizando logo, com transparência e concordância, os conflitos potenciais são minimizados. Inclusive, muitos recomendam o planejamento sucessório em vida (como doações, testamento, seguros), justamente para facilitar a transmissão e reduzir brigas – mas independentemente disso, após o óbito o inventário será necessário para formalizar tudo.
Uma vez finalizado o inventário, é crucial também que os herdeiros procedam aos registros de transferência (como mencionado na seção de passos). Não basta ter o formal de partilha ou a escritura; é preciso averbá-los onde couber (cartórios de imóveis, Detran, banco, etc.), efetivando a mudança de titularidade. Só assim o ciclo da regularização se completa. Isso evita problemas como: cobrança de IPTU na pessoa falecida (que pode gerar dificuldades se acumular débitos), necessidade de inventários “em cadeia” (por exemplo, se um herdeiro morre antes de terminar o inventário do ascendente, complica muito mais). Regularizando prontamente, cada herdeiro fica livre para dispor de seu quinhão e a memória do falecido em relação aos bens fica resolvida.
Em resumo, não adiar o inventário é uma recomendação prática essencial. Além de ser uma obrigação legal, trata-se de um passo que garante a regularização dos bens e evita complicações futuras para a família. Mantendo a herança regularizada, os herdeiros previnem multas, litígios e impedimentos de uso dos bens. Por fim, a regularização patrimonial traz tranquilidade – cumpre-se a última etapa da vida patrimonial do falecido de forma adequada e respeitosa, assegurando que seu legado seja transmitido conforme a lei e sua vontade (especialmente se houver testamento ou disposições específicas a cumprir).
Situações que impedem o inventário extrajudicial (e exigem via judicial)
Apesar das vantagens do inventário em cartório, há situações em que ele não pode ser utilizado, seja por previsão legal ou por cautela prática. Nesses casos, o inventário deverá ser feito judicialmente. Abaixo listamos os principais impedimentos da via extrajudicial, já considerando as atualizações até 2024:
- Falta de consenso entre os herdeiros: O acordo unânime é condição indispensável para a escritura de inventário. Se um ou mais herdeiros não concordam com a partilha proposta ou com qualquer aspecto (por exemplo, valor atribuído a um bem, inclusão de determinado bem ou reconhecimento de um herdeiro), o inventário não poderá seguir em cartório. Divergências entre interessados impõem a necessidade de um processo judicial, onde o juiz irá arbitrar o conflito. Portanto, litígio = inventário judicial.
- Herdeiro menor de idade ou incapaz (sem cumprimento dos requisitos especiais): Tradicionalmente, a presença de herdeiro menor de 18 anos ou juridicamente incapaz tornava obrigatório o inventário judicial. Como vimos, a partir de 2024 passou a ser possível fazer extrajudicial mesmo com incapaz, desde que preenchidos requisitos rígidos: todos os herdeiros concordes, partilha igualitária resguardando integralmente o quinhão do incapaz, e revisão posterior pelo Ministério Público. Na prática, isso significa que se houver um menor ou interdito na sucessão, só se optará pela via extrajudicial se todos os bens forem divididos de forma que o incapaz não tenha prejuízo algum (geralmente recebendo exatamente a parte que lhe cabe por lei em cada bem) e se o MP der parecer favorável. Caso contrário, ou se houver qualquer dúvida sobre a justiça da divisão, o caso deverá ser submetido ao Judiciário. Em suma, incapazes ainda representam uma restrição, flexibilizada em 2024, mas que impõe cautela: na dúvida, o tabelião não lavrará a escritura e remeterá ao juiz competente.
- Existência de testamento não confirmado judicialmente: Se o falecido deixou um testamento válido, a lei atual exige que ele seja judicialmente aberto e validado. Enquanto não houver uma decisão judicial confirmando as disposições testamentárias (ou declarando o testamento nulo, caduco, etc.), não se pode fazer o inventário em cartório. Portanto, a mera existência de um testamento obriga, em princípio, ao inventário judicial. Uma vez homologado o testamento pelo juiz (sentença transitada em julgado), aí sim os herdeiros podem optar por formalizar a partilha extrajudicialmente, se todos forem capazes e concordes. Importante: testamentos costumam demandar processamento judicial específico (chamado “autuação de testamento” ou “aprovação de testamento”) antes da partilha – o CNJ ainda não autoriza tabeliães a tratarem integralmente de sucessões testamentárias sem chancela judicial inicial. Observação: discute-se mudança legal para permitir inventário extrajudicial mesmo havendo testamento (com requisitos), e um projeto de lei nesse sentido está em andamento, mas até o momento a regra geral é essa restrição.
- Herdeiros desconhecidos ou ausência de herdeiros habilitados: Se não estiver claramente definida a totalidade dos herdeiros – por exemplo, aparece alguém alegando ser filho não reconhecido e isso está em disputa, ou não se sabe se determinada pessoa falecida deixou outros herdeiros – então a questão terá que ser decidida judicialmente. O cartório não pode fazer apuração de investigação de paternidade, reconhecimento póstumo de herdeiros, etc. Nesses cenários, o juiz conduzirá as diligências (citação de possíveis herdeiros, nomeação de curador ao ausente, etc.). Somente após resolvida a situação de quem são os herdeiros é que poderia se pensar em extrajudicial, mas como isso já envolve intervenção judicial, em geral todo o inventário segue no Judiciário.
- Dívidas superiores ao patrimônio (insolvência do espólio) ou disputas com credores: Quando o falecido deixa dívidas que excedem o valor dos bens, configura-se a possibilidade de insolvência do espólio. Tecnicamente, esse caso deveria tramitar num rito específico na Justiça (semelhante a uma falência da herança), para ratear pagamentos entre credores conforme prioridades legais. Um tabelião não tem poder para decidir quais credores serão pagos ou em que ordem se os bens não cobrem tudo. Assim, se a herança é insolvente ou há grandes disputas de credores sobre os bens, o caminho é judicial. No extrajudicial, todos os credores só recebem se houver acordo e quitação voluntária; caso contrário, qualquer credor preterido pode impugnar posteriormente e anular a escritura.
- Dúvidas jurídicas ou orientação do tabelião: Mesmo que não haja um impedimento legal explícito, pode ocorrer de o tabelião ter dúvidas sobre a possibilidade de lavrar a escritura em determinada situação. Por exemplo, se os documentos apresentados têm divergências significativas, ou se existe alguma peculiaridade que gere insegurança jurídica (tal como um bem litigioso, ou um herdeiro com deficiência intelectual leve sem interdição formal). Nesses casos, o CNJ orienta que o tabelião deve suspender o ato e encaminhar ao juiz competente. Portanto, sempre que o cartório entender que não tem elementos para prosseguir com segurança, o inventário extrajudicial não se concretizará. Essa medida preserva a segurança do ato notarial e evita prejuízo às partes – afinal, melhor resolver judicialmente do que fazer uma escritura que depois possa ser invalidada.
Em resumo, qualquer circunstância que comprometa a plena capacidade de decisão de todos os envolvidos, a clareza sobre quem tem direito ou a lisura da partilha será um impedimento para a via em cartório. Nesses casos, o inventário judicial entra em cena para dar as garantias e soluções necessárias. É importante avaliar, com orientação do advogado, se o caso concreto preenche os requisitos da escritura pública; caso haja algum dos impedimentos acima, já deve-se ingressar diretamente com o processo judicial, para ganhar tempo e evitar duplicidade de trabalho.
(Nota: Em 2024, o CNJ alterou a Resolução 35/2007 permitindo menores em inventário extrajudicial sob condições; também há projeto de lei para permitir extrajudicial com testamento e incapazes sob autorização judicial prévia. Essas mudanças apontam para uma tendência de redução gradativa dos impedimentos, ampliando a possibilidade do cartório mesmo em casos antes exclusivos do Judiciário. Por ora, entretanto, as restrições listadas acima devem ser observadas.)
Modelos práticos e checklist de documentos
Nesta seção, apresentamos um checklist de documentos úteis para organizar seu inventário e dois exemplos práticos ilustrativos – um de inventário extrajudicial e outro de judicial – para visualizar na prática como ocorrem esses procedimentos.
📋 Checklist de Documentos Essenciais para Inventário
Antes de iniciar, tenha em mãos os seguintes documentos (conforme detalhado na seção específica de documentos):
- Certidão de Óbito original do falecido.
- Documentos de identificação (RG e CPF) do falecido e de cada herdeiro.
- Certidões de estado civil: casamento (atualizada) do falecido; casamento ou nascimento atualizadas de cada herdeiro.
- Pacto antenupcial, se o falecido era casado sob regime diverso da comunhão parcial e houve pacto registrado.
- Testamento (se existir) ou Certidão do Registro de Testamentos (certidão negativa, se não houver testamento registrado).
- Relação de bens e documentos comprobatórios: matrícula atualizada de cada imóvel; documento de propriedade de veículos; extratos de contas bancárias/investimentos; documentos de ações/quotas de empresas; quaisquer outros títulos de propriedade de bens móveis de valor; documentos de dívidas ou contratos relevantes.
- Certidões negativas em nome do falecido: quitação de tributos (federais, estaduais, municipais); certidões de distribuições processuais (para verificar ações judiciais); certidão de inexistência de débitos trabalhistas, se aplicável; etc. (As exigências variam conforme o local e a situação do falecido, mas é recomendável obtê-las para garantir tranquilidade na partilha).
- Cálculo e guia do ITCMD emitida junto à Secretaria de Fazenda estadual, e comprovante de pagamento desse imposto.
- Procurações (se algum interessado for representado por terceiro ou pelo advogado) e documentos do advogado constituído (nº OAB, etc., geralmente incluídos nas peças).
- Outros documentos específicos do caso, conforme orientação do advogado ou exigência local (ex.: carteira do órgão de classe para casos de pensão, certidão de existência de filhos para militares, etc.).
Mantenha cópias físicas e digitais organizadas. Leve sempre os originais ao cartório ou fórum para conferência. Um dossiê bem montado evitará idas e vindas desnecessárias e acelerará o trâmite.
🤝 Exemplo prático de Inventário Extrajudicial (Cartório)
Caso: João falece e deixa como herdeiros sua esposa Maria e dois filhos maiores de idade, Ana e Pedro. João não deixou testamento. Os bens consistem em: um apartamento, um carro e uma conta bancária. A família, abalada pela perda, quer resolver tudo de forma rápida e amigável.
Procedimento: Maria, Ana e Pedro optam pelo inventário em cartório, já que todos estão de acordo e todos são capazes. Eles contratam um advogado de confiança em conjunto. O advogado orienta sobre os documentos – reúne a certidão de óbito de João, documentos pessoais de cada um, certidão de casamento de João e Maria, certidões de nascimento dos filhos, a escritura do apartamento, documento do carro e extrato da conta bancária, além de certidões negativas básicas. Com tudo em mãos, o advogado preenche a declaração do ITCMD junto ao site da Secretaria de Fazenda do estado; como o patrimônio de João vale, digamos, R$ 500 mil no total, o imposto devido (alíquota 4%) fica em R$ 20 mil. A família providencia o pagamento desse imposto dentro do prazo.
Em seguida, eles escolhem o Cartório de Notas de sua cidade. Vão ao tabelionato e manifestam a vontade de fazer a escritura de inventário. Apresentam todos os documentos e o comprovante do ITCMD pago. Eles já discutiram previamente e acordaram a seguinte partilha: Maria (cônjuge) ficará com 50% do apartamento + 50% da conta bancária (referente à meação dela, já que era casada em comunhão parcial), e dividirá a outra metade com os filhos; no fim, Maria fica também com o apartamento, Ana fica com o carro, Pedro fica com o saldo da conta bancária – cada um recebendo cotas equivalentes ao que têm direito. Todos concordam com essa divisão. O tabelião prepara a minuta da escritura conforme as instruções do advogado e documentos. Após revisão, é marcada a data para assinatura.
No dia agendado, Maria, Ana, Pedro e o advogado comparecem ao cartório. O tabelião faz a leitura da escritura de inventário e partilha, que discrimina todos os dados (quem era João, quem são os herdeiros, quais os bens e valores, imposto pago e divisão acordada). Todos assinam a escritura pública. Eles pagam os emolumentos do cartório, que, suponhamos, ficaram em cerca de R$ 2.000,00 (valor fixado pela tabela do Estado para aquele montante de bens). Com a escritura assinada, o inventário está concluído.
Agora, cada herdeiro toma providências de registro: Maria leva a escritura ao Registro de Imóveis para registrar o apartamento em seu nome; Ana vai ao DETRAN transferir o carro para seu nome; Pedro entrega a escritura no banco, que libera e transfere formalmente o saldo da conta para ele. Em poucas semanas, toda a herança de João foi regularizada sem precisar passar pelo Fórum. A família economizou tempo (tudo resolveu-se dentro de 2 meses) e o processo foi relativamente sereno, graças ao acordo entre eles.
⚖️ Exemplo prático de Inventário Judicial (Judiciário)
Caso: Francisco falece, viúvo, deixando três filhos, sendo dois adultos e um menor de 15 anos. Ele também deixa um testamento dispondo uma parte de seus bens para um sobrinho. Além disso, os irmãos adultos de Francisco discordam sobre quem deve ficar com a casa deixada por ele. Diante dessas circunstâncias (herdeiro menor, testamento e conflito), a família não pode usar o cartório.
Procedimento: Será necessário ingressar com inventário judicial. Um dos filhos contrata um advogado e propõe a abertura do processo no Fórum competente. O advogado reúne a certidão de óbito, documentos dos herdeiros, o testamento original deixado por Francisco e lista todos os bens (uma casa, um carro e aplicações financeiras) e dívidas conhecidas. Ele protocola a petição de inventário indicando a existência do menor (que terá tutela da irmã mais velha durante o processo) e do testamento. O juiz nomeia essa filha mais velha como inventariante. O Ministério Público passa a acompanhar o caso (por causa do menor e do testamento).
No curso do processo, o testamento é devidamente autuado e confirmado pelo juiz – o documento era válido e determinava que metade da casa de Francisco fosse dada ao sobrinho. Os filhos inicialmente contestam, mas reconhecem a validade após orientação jurídica. Como há divergência sobre a casa (dois filhos querem ficar com ela), o juiz incentiva uma conciliação. Acaba-se decidindo vender a casa e dividir o valor entre todos, respeitando o testamento (sobrinho ficará com uma parte do valor da venda correspondente à metade da casa que lhe foi deixada). Essa decisão foi tomada após algumas audiências e muita conversa – o processo levou meses nessa discussão. Enquanto isso, foi pago o ITCMD devido sobre os bens de Francisco (no estado deles, 4% sobre o total). Também foram apresentadas avaliações judiciais para a casa e o carro, a fim de estipular os valores de partilha.
Ao final, alcança-se um acordo homologado: a casa será vendida e 50% do valor entregue ao sobrinho (legado do testador) e 50% divididos entre os três filhos; o carro fica para um dos filhos e os outros recebem compensação em dinheiro das contas bancárias de Francisco, equilibrando as cotas; o menor de 15 anos terá sua parte depositada em uma conta judicial até atingir a maioridade, conforme determinação legal para proteção. O juiz, com parecer favorável do MP quanto ao menor, profere a sentença de partilha confirmando esses termos. São expedidos os Formais de Partilha necessários: um para o registro da venda da casa (em nome do comprador, depois de vendida, com as quotas definidas), um para transferir o carro, etc., além de alvarás para liberar as quantias em dinheiro aos maiores e para o sobrinho.
Todo o inventário judicial de Francisco demorou cerca de 18 meses até a conclusão, devido aos trâmites do testamento e das discordâncias iniciais. Houve custos maiores com advogado e perícias. Porém, garantiu-se que o menor teve seus interesses protegidos (com MP fiscalizando) e que o testamento foi cumprido conforme a vontade de Francisco. Sem o processo judicial, os filhos não teriam chegado a um acordo facilmente. Ao final, com a homologação, todos os bens foram regularizados: o carro transferido, o dinheiro distribuído e a casa vendida com autorização judicial, repassando a cada um sua parte.
Lição dos exemplos: Sempre que possível, buscar o consenso e optar pela via extrajudicial simplifica a sucessão. No entanto, em situações onde isso não é viável, o Judiciário oferece o caminho necessário – embora mais lento – para assegurar que ninguém seja prejudicado e que a lei seja cumprida. Cada caso deve ser analisado com bom senso e orientação profissional para decidir o melhor rumo.
Dados estatísticos atualizados sobre inventários no Brasil
Nos últimos anos, o cenário dos inventários no Brasil vem mudando significativamente devido à crescente adoção do inventário extrajudicial. Alguns dados atualizados (2022-2024) ilustram essa tendência e permitem comparar as duas modalidades em termos de uso e eficiência:
- Aumento do uso da via extrajudicial: Desde que foi introduzida em 2007, a escritura de inventário em cartório teve adesão cada vez maior. No primeiro ano (2007) foram pouco menos de 38 mil inventários extrajudiciais realizados. Em 2023, esse número saltou para 242.853 inventários extrajudiciais no país. Em 2022, logo após o auge da pandemia, registrou-se um recorde de aproximadamente 250 mil inventários em cartório. Ao todo, de 2007 até 2023, já foram feitos mais de 2,3 milhões de inventários extrajudiciais no Brasil. Esses números, compilados pela Associação dos Notários e Registradores (Anoreg/BR) no relatório Cartório em Números, evidenciam uma forte tendência de desjudicialização na área sucessória.
- Comparação com inventários judiciais: Enquanto centenas de milhares de inventários vão para cartórios anualmente, muitos outros continuam sendo processados via Judiciário. É difícil obter um número exato nacional de inventários judiciais, pois eles se misturam às estatísticas de ações judiciais em geral. Porém, para ter ideia, em 2022 ocorreram cerca de 1,36 milhão de óbitos no Brasil, e nesse mesmo ano contabilizaram-se ~213 mil inventários extrajudiciais. Ainda que nem todo óbito gere inventário (às vezes a pessoa não deixa bens, ou o inventário não foi feito no mesmo ano do falecimento), nota-se que os números de cartório estão longe do total de sucessões possíveis – ou seja, muitos inventários ainda tramitam no Judiciário ou permanecem pendentes. Isso se deve em parte aos casos que não podem ir para cartório (menores, testamento, litígio) e também ao desconhecimento ou opção das partes. Ainda assim, o crescimento ano a ano da via extrajudicial vem reduzindo a proporção de inventários resolvidos nos tribunais. Em alguns estados, a maioria dos inventários consensuais já migrou para os cartórios, ficando no Judiciário basicamente os litigiosos.
- Tempo médio de tramitação: Estatísticas confirmam que o tempo médio de conclusão difere radicalmente. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de 2023, um inventário extrajudicial é finalizado em cerca de 1,5 mês (45 dias) em média, enquanto o inventário judicial costuma levar de 6 meses a vários anos, dependendo da complexidade. A Anoreg indicou que no Judiciário o tempo médio chega a ser de pelo menos 2 anos, contrastando com a possibilidade de resolver em dias ou semanas no cartório. Outra fonte apontou que, se tudo correr bem, um inventário judicial ainda assim leva em torno de 12 meses, mas pode ultrapassar 5, 10 anos se houver conflitos intensos. Esses números mostram o abismo de duração entre os procedimentos, reforçando o porquê de muitos optarem pela via extrajudicial sempre que possível.
- Impacto econômico: A economia gerada pela opção extrajudicial também é mensurável. A delegação de inventários aos cartórios poupou recursos do Judiciário e das partes. Estimativas citadas pela Anoreg/IBDFAM indicam que, com mais de 2 milhões de atos realizados em cartório desde 2007, houve uma economia de aproximadamente R$ 5,6 bilhões aos cofres públicos (redução de despesas do sistema de justiça), além da economia direta aos cidadãos com custas e tempo. Um notário membro do IBDFAM apontou que, graças ao inventário em cartório, os prazos médios de uma herança caíram de 10 anos para cerca de 15 dias na comparação entre a Justiça e o tabelionato – claro, essa é uma forma de ilustrar o ganho de eficiência em casos simples. Do ponto de vista dos herdeiros, um estudo mencionado anteriormente mostrou redução de até 40% nos custos totais quando optam pelo inventário extrajudicial.
- Distribuição geográfica: Estados mais populosos lideram em números absolutos de inventários extrajudiciais. De 2007 a 2023, São Paulo foi responsável por cerca de 880.751 escrituras de inventário, seguido do Paraná (265.508) e Rio Grande do Sul (261.173). O Rio de Janeiro teve 145.701 nesse período. Isso reflete não só a população, mas também o grau de aderência ao novo modelo em cada região. Estados com tradição notarial forte ou políticas ativas de divulgação tendem a ter mais inventários em cartório. Contudo, mesmo em estados menores, observa-se crescimento. Em termos proporcionais, alguns estados do Sul e Sudeste adotaram bastante a via extrajudicial, enquanto em regiões Norte/Nordeste a judicialização ainda pode ser maior – possivelmente por menor divulgação ou questões culturais, algo que vem mudando gradativamente.
- Tendências recentes (2023/2024): A expectativa das autoridades e especialistas é de continuidade na tendência de extrajudicialização. Em 2024, com a mudança normativa permitindo inventário em cartório mesmo com menores (consensualmente), espera-se um aumento adicional do uso dessa via. Da mesma forma, discute-se no Congresso a permissão via lei para extrajudicial com testamento (desde que o testamento seja previamente registrado judicialmente). Essas medidas devem ampliar o escopo de casos resolvíveis fora dos tribunais. Profissionais apontam, porém, que é preciso divulgar mais ao público as vantagens do inventário extrajudicial, pois ainda há resistência por desconhecimento. A tendência é que, à medida que mais pessoas saibam da possibilidade e confiem no procedimento em cartório, a grande maioria dos inventários sem litígio migre para a esfera extrajudicial, ficando no Judiciário apenas aqueles inevitáveis (conflituosos ou muito complexos). Isso tornará a Justiça mais eficiente e também beneficiará os cidadãos com soluções mais ágeis.
Para concluir, os números recentes contam uma história clara: o inventário extrajudicial saiu de uma novidade tímida em 2007 para se tornar uma ferramenta consolidada em 2023, responsável por centenas de milhares de partilhas anuais. Os ganhos em tempo e custo são evidentes pelas estatísticas. Ainda há um caminho para que todos os que podem utilizem essa via, mas o rumo é promissor. O importante é que as famílias estejam informadas das suas opções e escolham com consciência a modalidade mais adequada – e, independentemente do caminho, que não deixem de fazer o inventário, assegurando a regularização do patrimônio e a efetivação dos direitos de cada herdeiro. Com planejamento, orientação jurídica e cooperação entre os familiares, o processo de inventário deixa de ser um “bicho de sete cabeças” e cumpre seu papel de maneira tranquila e eficiente.