O Direito do Paciente ao Prontuário Médico: Prazos, Responsabilidades e Consequências Jurídicas pelo Não Fornecimento
Por Paulo Moraes Advogados | Especialistas em Direito Médico, Direito Penal Econômico e Proteção de Dados
Introdução
O prontuário médico é um dos documentos mais relevantes na relação entre paciente e profissional de saúde, representando não apenas o histórico clínico, mas também o direito fundamental de acesso à informação e à própria intimidade.
A sua negativa ou demora injustificada no fornecimento pode gerar sérias consequências jurídicas para hospitais, clínicas e profissionais de saúde, abrangendo responsabilidades civis, administrativas, éticas e até penais.
Este artigo tem por objetivo oferecer uma orientação técnica completa sobre o tema, com base nas normas legais vigentes e na mais recente jurisprudência nacional.
1. A Natureza Jurídica do Prontuário Médico
O prontuário médico, embora elaborado e mantido pelo estabelecimento de saúde ou pelo médico, pertence ao paciente. Essa orientação é consolidada:
- Constituição Federal (art. 5º, X e XII): proteção da intimidade, vida privada e sigilo de dados pessoais;
- Código de Defesa do Consumidor (arts. 6º, III, e 31): direito à informação clara e adequada;
- Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/2018, art. 18): direito do titular de dados de obter acesso facilitado às informações pessoais;
- Código de Ética Médica (Resolução CFM nº 2.217/2018, arts. 73 a 89): direito de acesso pelo paciente ao seu prontuário, sendo vedada sua divulgação a terceiros sem consentimento ou decisão judicial.
Portanto, o paciente não precisa justificar o pedido e não pode ser privado de seu acesso.
2. Qual o Prazo Legal para Entrega do Prontuário Médico?
Apesar da ausência de prazo expresso em lei federal, a interpretação sistemática dos direitos do consumidor, da proteção de dados e da ética médica impõe a entrega em prazo razoável, sob pena de responsabilização.
Prazos indicados por fontes oficiais e judiciais:
Fonte | Prazo sugerido para entrega |
Ministério Público do Paraná (Recomendação Administrativa) | 10 dias |
Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) | 15 dias (orientativo) |
Entendimentos judiciais em ações cautelares | Imediato ou prazo de poucos dias |
Prazos superiores a 15 dias, como 30 ou 45 dias, são considerados excessivos e abusivos.
Entendimento dos Tribunais
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) e diversos Tribunais Estaduais vêm entendendo que o direito do paciente deve ser atendido de forma célere e prioritária, sob pena de configuração de dano moral.
Exemplos:
- TJDFT – Apelação Cível 0742221-84.2020.8.07.0001: reconheceu a obrigatoriedade da entrega do prontuário ao paciente, sem necessidade de decisão judicial prévia.
- STJ – REsp 1.653.261/SP: reafirmou a necessidade de preservação do sigilo, mas com acesso assegurado ao próprio titular.
3. Quais as Consequências Jurídicas pela Recusa ou Demora?
A recusa injustificada ou a entrega tardia do prontuário médico pode acarretar as seguintes consequências jurídicas:
3.1. Responsabilidade Civil
- Indenização por Dano Moral: a jurisprudência entende que a negativa ou atraso na entrega do prontuário viola direitos fundamentais do paciente, ensejando reparação por danos morais. Valores variam conforme o caso concreto, podendo alcançar valores expressivos.
Exemplo: Condenação de hospital a pagar danos morais por extravio de prontuário — TJDFT, Processo nº 0705814-41.2017.8.07.0016.
3.2. Multa Cominatória Judicial
- Em caso de ação judicial, o magistrado pode fixar multas diárias (astreintes) em caso de descumprimento da ordem de exibição de documentos, com fundamento no art. 536 do Código de Processo Civil.
3.3. Responsabilidade Administrativa
- Aplicação de multas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), nos termos da LGPD, com possibilidade de multa de até 2% do faturamento da instituição, limitada a R$ 50 milhões por infração.
3.4. Sanções Ético-Profissionais
- Os Conselhos Regionais de Medicina podem instaurar Processo Ético-Profissional contra médicos que não respeitarem o direito de acesso do paciente ao seu prontuário.
4. Boas Práticas para Hospitais, Clínicas e Profissionais de Saúde
Para garantir a regularidade no tratamento de prontuários médicos, recomenda-se:
- Estabelecer prazo interno máximo de 10 dias úteis para atendimento de solicitações de prontuário;
- Fornecer cópia integral ou parcial do documento ao paciente, mediante simples requerimento escrito;
- Cobrar, se for o caso, apenas o valor de custo da reprodução (ex.: cópias físicas);
- Manter protocolo formal de entrega e recibo de recebimento;
- Implantar Programa de Compliance e Proteção de Dados Pessoais em Saúde (LGPD);
- Capacitar colaboradores sobre o tratamento correto das solicitações.
5. Conclusão
O direito de acesso ao prontuário médico é indisponível e diretamente relacionado aos direitos fundamentais da personalidade.
A negativa, a demora injustificada ou a criação de obstáculos administrativos para o fornecimento do prontuário ao paciente configuram ilícito civil, podendo gerar indenizações, multas e sanções administrativas e éticas.
O compromisso com a transparência, a ética e a celeridade é não apenas uma exigência legal, mas também uma construção da confiança entre o paciente e o serviço de saúde.
Caso haja negativa ou dificuldades no acesso ao seu prontuário, o paciente poderá recorrer ao Poder Judiciário para ver garantido seu direito, com o suporte de uma assessoria jurídica especializada.
Paulo Moraes Advogados
Especialistas em Direito Médico, Penal Econômico e Proteção de Dados