Paulo Moraes Advogados

Caso Da SIEMENS – Advogado Paulo Moraes

RESUMO

O Caso Siemens é um exemplo paradigmático no mundo corporativo, destacando os desafios relacionados à ética nos negócios e à conformidade com normas. Siemens, uma das maiores empresas de engenharia elétrica e eletrônica, foi envolvida em escândalos de corrupção e suborno para garantir contratos milionários, especialmente após a Segunda Guerra Mundial. Essas práticas ilícitas prejudicaram significativamente a reputação e as finanças da empresa.

O estudo analisa os eventos que levaram ao escândalo, os impactos negativos para a Siemens e o mercado corporativo, e como a reestruturação e implementação de um robusto sistema de compliance transformou a Siemens em uma referência de ética empresarial. A análise enfatiza a importância de processos de integridade e compliance para promover uma cultura empresarial ética e prevenir práticas ilegais.

Palavras-Chave; Siemens; Corrupção; Suborno; Compliance; Ética Empresarial; Reputação Corporativa; OCDE; FCPA; Transparência; Sustentabilidade Corporativa

INTRODUÇÃO

O caso Siemens foi um paradigma no mundo corporativo internacional, revelou a complexidades e desafios enfrentada pelo mercado mundial, em relação à ética nos negócios e à conformidade das normas e seus efeitos no espaço e tempo.

No decorrer de anos, a Siemens, uma das maiores empresas de engenharia elétrica e eletrônica do mundo, situada na Alemanha, foi envolvida em diversos escândalos por corrupção e suborno que eram utilizados para garantir contratos milionários, método corrupto era utilizado para catalisar o processo de expansão internacional.

Essa conduta ilegal e desprovida de ética levou um grande prejuízo a reputação da empresa e impactaram significativamente no desempenho financeiro e operacional da empresa, incluindo prejuízos derivados de diversos processos enfrentado pela empresa que gerou um prejuízo bilionário a empresa e acionistas.

Este estudo analisa os eventos que levaram ao escândalo da Siemens, impactos negativos a empresa e o mundo corporativo, também demonstra como reestruturação da empresa e a implementação do compliance tornou uma das principais referências para todo mundo corporativo e governos.

 Este estudo demonstra importância da implementação de processos e procedimentos de integridade e compliance, para nortear as empresas na disseminação de uma cultura empresarial voltada para um ambiente ético, e de respeito as normas vigentes, prevenindo e combatendo quaisquer práticas ilegais e imorais.

DESENVOLVIMENTO

Um dos maiores paradigmas da aplicação do compliance no mundo corporativo é o caso Siemens, que teve seu início nas práticas ilícitas de suborno logo após a Segunda Guerra Mundial, no ano de 1950, conforme relata a revista alemã.

Porém, a empresa foi fundada em 1847, tendo que se reinventar no pós-Segunda Guerra Mundial, sendo a década de 50 um período de recuperação para a empresa. Atuou fortemente em seus maiores projetos na Europa e na América do Sul, incluindo, em 1978 na fabricação dos cinco maiores geradores da hidrelétrica de Itaipu.

Ainda segundo a revista alemã Der Spiegel, em uma conversa entre o presidente de administração da Siemens, Hermann Franz, e o então presidente do grupo, Gerd Tacke, Tacke teria dito estar “completamente convencido” de que “o comércio exterior só é possível com o auxílio de suborno e dos instrumentos necessários para tal, ou seja, dos caixas dois”.

Sendo o suborno uma maneira de sobressair no mercado internacional, porém, a mesma postura não foi adotada no mercado interno, que, de acordo com relatos, seria “perigosíssimo”.

Na década de 1980, foi criado um sistema de caixa dois com o intuito de pagar propina, método utilizado para catalisar a expansão internacional da empresa e torná-la ainda mais competitiva, com penetração em países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, onde a corrupção está disseminada em toda sua estrutura.

A empresa então utilizou o método de caixa dois para pagar propina e suborno por vinte anos, dos anos de 1980 a 2000, quando fizeram uma alteração para operar a propina com outra roupagem, dissimulando-a como contratos de consultoria fictícios, uma forma de tentar dar mais formalidade e legalidade aos atos ilegais.

Na década de 1990, a importância da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) era significativa por várias razões. Pós-Guerra Fria e Globalização: Com o fim da Guerra Fria, houve um aumento na integração econômica e globalização. A OCDE desempenhou um papel crucial na promoção da cooperação econômica entre os países membros e na facilitação do comércio internacional.

Desenvolvimento de Padrões Internacionais: A OCDE trabalhou para desenvolver padrões internacionais em várias áreas, incluindo comércio, investimento, tributação e políticas sociais. Isso ajudou a criar um ambiente mais previsível e estável para as empresas e investidores em todo o mundo.

Combate à Corrupção: Durante os anos 1990, a OCDE intensificou seus esforços para combater a corrupção internacional. Isso culminou na adoção da Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, em 1997, estabelecendo padrões rigorosos para os países membros em relação à corrupção transnacional.

Em suma, na década de 1990, a OCDE desempenhou um papel crucial na promoção da cooperação econômica internacional, no estabelecimento de padrões internacionais e na luta contra a corrupção, contribuindo para um ambiente mais justo e sustentável para o comércio global.

Nos EUA, a Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA – Foreign Corrupt Practices Act) é uma das leis mais importantes no combate à corrupção internacional. Ela proíbe empresas dos EUA e indivíduos de subornar funcionários estrangeiros para obter ou manter negócios, sendo uma importante ferramenta para promover transparência global e nivelar o campo para todas as empresas, criando consciência para o compliance, dissuadindo práticas corruptas com penalidades severas e promovendo cooperação internacional contra a corrupção.

Na década seguinte, a Siemens passou a ser listada na Bolsa de Valores de Nova York e teve que se submeter às leis americanas, como a FCPA, que impede a prática de pagamento de propina. Deixando claro que membros da diretoria da Siemens e alto escalão da empresa tinham conhecimento das normas e como a empresa deveria se portar em suas contratações com empresas, governos e órgãos públicos.

Até 1999, na Alemanha, o suborno para governo estrangeiro não era considerado um crime específico no código penal alemão. Além disso, as empresas alemãs podiam deduzir os pagamentos de suborno como despesas comerciais legais, o que permitia um desconto fiscal de até 10%. Esta lei era conhecida como “Rabattgesetz”, era amplamente utilizada, apesar de ser considerada antiética, sendo revogada em 1999, quando a Alemanha ratificou a Convenção antissuborno da OCDE.

No início dos anos 2000, revisitou-se uma carta do governo da Áustria, elaborada a partir de determinação do Judiciário da Suíça, o objeto era recursos financeiros pelo ex-ditador Sani Abacha da Nigéria, e que já se encontrava falecido em 1998, que expôs uma série de supostos pagamentos de suborno efetuados pela Siemens e outras empresas alemãs para garantir contratos milionários na Nigéria. A carta foi divulgada pela imprensa mundial, levando assim os holofotes para práticas de corrupção das multinacionais, o que gerou investigações em todo o mundo.

Nesta carta, existia menção de funcionários da Siemens, onde constava recebimento da Empresa como a denominação de despesas úteis, essa conta que recebia recurso para pagamentos de suborno, teria supostamente sido aberta sem conhecimento e anuência da administração da Siemens.

Em 2002, a Alemanha promulgou a Lei de Penalização de Suborno, que tornou crime o suborno tanto no setor público quanto no setor privado. Antes dessa legislação, o suborno no setor privado era tratado de forma menos rigorosa do que no setor público. A nova lei equiparou os dois, tornando o suborno uma ofensa criminal em ambas as esferas. Isso significava que mesmo pessoas que não ocupavam cargos públicos poderiam ser processadas por suborno se estivessem envolvidas em práticas corruptas no ambiente de negócios privado.

Em 2003, continuaram a aparecer evidências de subornos e corrupção, a equipe de auditoria tributária descobriu pagamentos suspeitos, efetuados em contratos de consultoria, também foram observados grandes saques de valores, descobrindo saques de 4 milhões de euros, valores enviados para Nigéria.

Após o escândalo, o departamento jurídico chegou a propor que fosse efetuado uma atualização e reforma do sistema de compliance da Siemens. A empresa, relutante, implementou as mudanças cerca de um ano depois.

No Brasil, em 2002, a empresa ganhou uma licitação de R$ 33 milhões para fazer a manutenção de veículos, porém a própria Siemens denunciou ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), formação de cartel com outras multinacionais da França, Canadá, Espanha e Japão, para manipular os preços.

Porém, com as alterações de compliance que criaram diversas regras e controles para combater e prevenir subornos e lavagem de dinheiro na empresa, essas determinações foram apresentadas por meio de circulares que expunham uma série de mecanismos e condutas a serem adotados na empresa.

Porém essa atitude não foi suficiente para barrar diversos processos que a empresa enfrentava em diversos países, sendo condenada na justiça dos EUA a pagar uma multa de 800 milhões de dólares, já na Alemanha, foi condenada a pagar 395 milhões de Euros. A empresa também foi condenada em diversos países. No Brasil, a Siemens foi condenada ao pagamento de R$ 14,4 milhões em danos morais coletivos pela formação de cartel em licitações do metrô de Brasília e ao bloqueio de 60 milhões no caso do metrô de São Paulo –SP.

Em 2007, em meio a processos, multas, indenizações e pagamentos de advogados e à Fazenda, custou a demissão do então presidente-executivo, Kraus Kleinfeld, e do presidente do conselho de supervisão, Heinich von Pierer.

Após condenações, o conselho de supervisão da Siemens resolveu processar seus ex-diretores que estavam sob administração na vigência em que ocorreram os subornos, mais de 300 pessoas foram acusadas de participar nos casos de corrupção na Siemens, que envolvem o pagamento de propinas que somam 1,3 bilhão de euros.

Então foi prometido a todos os funcionários que reconhecessem seus atos fraudulentos anistia total, mas se não o fizessem e fossem descobertos, seriam instantaneamente demitidos. Assim sendo, 130 funcionários reconheceram seus atos fraudulentos e deram informações sobre os fatos.

Quase toda a diretoria administrativa da Siemens se propôs a fechar o acordo, salvo a exceção do antigo diretor financeiro Heinz-Joaquim Neuburger, que pagaria o valor de 4 milhões de euros, alegando em sua defesa que não havia violado nenhum dever. Apesar de a empresa poder pleitear judicialmente valores maiores, se ateve a processar requerendo o valor de 15 milhões de dólares, que seriam destinados ao pagamento de honorários advocatícios, porém foram incluídos também os valores contratados pelos contratos fictícios da companhia na Nigéria.

Essa foi uma estratégia utilizada pelos advogados da Siemens para incluir no processo apenas elementos fáceis de provar e calcular, honorários advocatícios e contrato fictício.

Os advogados utilizaram em sua argumentação para pleitear a indenização, de forma sucinta e objetiva que o Heinz-Joachim Neuburger teria violado os seus deveres como administrador quando não conseguiu gerir a empresa e seus funcionários nas atividades lícitas, não proporcionando o funcionamento adequado do Compliance empresarial, mesmo em posse de elementos que evidenciam atos ilícitos da empresa e de seus funcionários.

Em sua defesa Heinz-Joachim Neuburger argumentou que tomou todas as medidas cabíveis, mesmo aquelas impostas pelo compliance, sendo inconcebível imputar responsabilidade por pagamentos ilícitos efetuados à Nigéria, por serem atos que transcendem sua responsabilidade e alçada.

O tribunal (Landgericht München), em análise do caso, deferiu o pedido da Siemens, condenando o ex-administrador ao pagamento de 15 milhões de Euros como compensação por não garantir o estabelecimento de um sistema de gestão de conformidade funcional (“CMS”), o embasamento da decisão foi alicerçado na obrigação do administrador de garantir a legalidade dos atos praticados pela companhia, o dever de legalidade (legalitätspflicht).

Faz parte da responsabilidade de liderança e organizacional do conselho de administração de uma AG (o mesmo se aplica à administração da GmbH!) garantir, da melhor forma possível, que a empresa e seus funcionários “cumpram todas as disposições que afetam a empresa como sujeito de direito”. Essas disposições incluem a proibição de pagamentos de propina a autoridades nacionais e estrangeiras ou a particulares. Tais pagamentos de propina “também não podem ser justificados pela consideração de que, caso contrário, o sucesso econômico nos mercados estrangeiros corruptos não seria possível”. A administração cumpre sua responsabilidade de liderança apenas se garantir que a empresa seja organizada e supervisionada de forma que tais violações da lei não ocorram.

A empresa, que transformara o suborno como um modelo de negócio, resolveu mudar a cultura da empresa e para isso, demitiu 80% dos executivos do mais alto escalão, 70% do segundo escalão e 40% do terceiro escalão.

CONCLUSÃO

Após caso Siemens tivemos um marco para o mundo corporativo, trazendo novas premissas e paradigmas para as empresas, onde, condutas antiéticas nos negócios são severamente punidas, especialmente em um contexto globalizado, onde empresas são cada vez mais responsabilizadas pelas suas ações.

No caso Siemens fica claro, que a inexistência de compliance permitiu práticas de corrupção, causando danos, não apenas financeiros, mas reputacionais e legais. Deixando em evidência a importância de implementar programa de compliance eficiente, haja vista que o compliance não é apenas regras e normas frias, as mesmas devem ser incorporadas a cultura da empresa.

Novos padrões internacionais como estabelecidos pela OCDE e a adesão de como a Americana da FCPA, que combate e evita a corrupção corporativa, porém caso Siemens destaca a importância de disseminar de uma cultura organizacional ética, onde os valores de integridade e transparência são cultivados de maneira contínua em todos os níveis da empresa.
            O compliance desempenha um papel fundamental na blindagem das empresas e dos investidores contra problemas futuros. Ao estabelecer e aplicar políticas rigorosas de conformidade com as leis e regulamentos, as empresas podem detectar e prevenir potenciais violações legais ou éticas antes que elas ocorram. Criando uma proteção a reputação da empresa, mas também evita a exposição a multas e penalidades cíveis, ambientais e criminais.

A responsabilidade cível já é algo corriqueiro em todos os ordenamentos, porém, responsabilidade penal das empresas é conceito complexo que envolve a capacidade das empresas de serem responsabilizadas por crimes cometidos em seu nome ou benefícios de seus interesses. O Direito penal se direcionou na responsabilidade dos indivíduos, porém os ordenamentos jurídicos estão reconhecendo a importância de responsabilizar as empresas por condutas criminosas.

Em muitos ordenamentos jurídicos são impostos que determinadas empresas implantem sistemas de compliance, para evitar condutas criminosas. A falha de implementação dos processos e procedimentos de compliance e integridade, pode inserir responsabilidades penais da empresa por atos de seus funcionários.

Com um programa de compliance robusto proporciona transparência e confiança aos investidores, demonstrando um compromisso claro com a integridade e a responsabilidade corporativa. Investidores conscientes estão cada vez mais atentos à conformidade das empresas em que investem, por reconhecerem que a falha em cumprir regulamentos pode resultar em riscos financeiros e legais para seus investimentos. Concluindo que o compliance não é apenas uma medida preventiva, mas também uma estratégia essencial para proteger os interesses de longo prazo das empresas e de seus investidores, garantindo uma operação ética e sustentável ao longo do tempo.

Conclusão a ser tirada do caso Siemens é que a integridade empresarial não é apenas uma questão de conformidade legal, mas também uma necessidade fundamental para garantir a sustentabilidade e o sucesso a longo prazo no mundo dos negócios globais. A lição aprendida com a Siemens é que a ética nos negócios não é apenas uma opção, mas uma obrigação para as empresas que desejam prosperar em um ambiente competitivo e exigente.

REFERÊNCIAS

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BRASIL. CNM/CUT. Disponível em https://cnmcut.org.br/noticias/ex-diretor-da-siemens-e-condenado-a-dois-anos-por-corrupcao-6bb3 Acesso dia 29 de Abr. 2024

BRASIL. BBC Brasil. Disponível em https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2013/08/130812_siemens_escandalo_dg

Acesso 30 de abril de 2024

BRASIL. El País. Disponível em https://brasil.elpais.com/brasil/2017/02/06/internacional/1486411299_340049.html acesso dia 30 de abril 2024.

ALEMANHA. Sueddeutsche Zeitung. Disponível em https://www.sueddeutsche.de/wirtschaft/prozess-um-siemens-korruptionsaffaere-ex-finanzchef-neubuerger-muss-wohl-15-millionen-zahlen-1.1840755 Acesso dia 30 de Abr. 2024

ALEMANHA. The Conversation. Disponível em https://theconversation.com/lessons-from-the-massive-siemens-corruption-scandal-one-decade-later-108694 . Acesso dia 30 de Abr. 2024

ALEMANHA. Businessinsider. Disponível em  https://www.businessinsider.de/bi/macht-millionen-podcast-20-siemens-korruptionsaffare-schmiergeld/ . Acesso dia 30 de Abril 2024

EUA. Internacional Trade Administration . Disponível em https://www.trade.gov/us-foreign-corrupt-practices-act. Acesso dia 30 de Abr. 2024.

FRANÇA. OECD Anti-corruption & integrity hub. Disponível em https://www.oecd.org/corruption-integrity/ . Acesso dia 30 de Abr. 2024.

Paulo Moraes

Proprietário Paulo Moraes Advogados

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